- "E você agora faz parte de meu jogo".
- Han? Não entendi.

- Estranho, também não entendi esse conto, Bia.
- Ah! O assassino es-

Bia parou de falar assim que as luzes começaram a piscar.

Lucas arregalou seus olhos e olhou fixamente para mim. As luzes por fim apagaram, junto com qualquer outro aparelho eletrônico que estava ligado.

- Mano... O que tá acontecendo? Estou com medo!
- Calma Bia...

Ele me abraçou com força.

- Venha, vamos tentar descer lá para baixo. Você está com seu celular aí?

Eu fucei os meus bolsos, acho que o Luca fez o mesmo.

- Não. Agora lembrei que o deixei carregando lá em baixo na sala.
- Droga, o meu ficou na cozinha.

- Mano, tá muito escuro pra ver!
- Segura na minha camisa, e vamos nos apoiando pelas paredes.

Não pude dizer mais nada, pois mesmo que quisesse, fui interrompido por um tremor forte, era como um terremoto, mas... Não parecia vir do chão, e sim, do teto.

E então os dois caíram para cima.


- Argh!
- Ouch!

- Mas que porra tá acontecendo aqui! Bia, você tá bem?
- Ma... Luca... -

Pude ouvir seus dentes batendo, ela estava tremendo, tremendo de medo...

- Diga, Bia...
- Is... Isso é como na... é como naquele conto...

Então me lembrei do conto que acabamos de ler...

- Deus, não pode ser... Isso não pode ser real.
- Então como explica essa nossa queda se... se estávamos no chão?

- Não, mana. Você tá viajando! O piso da casa só pode ter desabado!
- Você a... acha mesmo?

- Mas é claro que sim! - Falei bravo com ela - caso contrário as luzes já deveriam estar acesas e deveríamos estar cercados por cadáveres agora!
- Para! - Gritei com o estúpido do Lucas - não diga algo tão horrível ass...

As luzes se acenderam, revelando o horror em que se encontravam.

O grito de horror de Beatriz foi rasgante e ao mesmo tempo penetrante.

As pernas de Lucas começaram a tremer e, antes que percebessem, os dois estavam abraçados. Difícil dizer quem estava mais horrorizado com aquela realidade, se Lucas ou Beatriz que, a propósito, havia mijado nas calças.

Os dois olhavam para o quarto onde estavam, notaram que realmente o seu chão de agora antes era o teto, corpos e tripas espalhados para todos os lados e em todas as posições, como se as leis da física não fizessem efeito ali. As paredes antes azuis claro, agora tingido por diversas tonalidades de vermelho, seguido de respingos, borrões e marcas de mão, tudo feito de sangue.

- Não. Não olhe Bia! - Huh, a quem estou querendo enganar? Ela já olhou, e agora está em prantos em meus braços. Puta merda - Mana, vamos dar o fora daqui.

Ele pegou em minha mão e me arrastou para fora daquele que era seu quarto. Eu reconheci alguns daqueles corpos que lá estavam. Meu desespero, angustia e medo me fazendo chorar rios de lágrimas, mas ainda sim me sentia segura com meu irmão.

Passamos pelo corredor, descemos a escada, estava ruim de enxergar, a luz que iluminava aquele lugar que um dia chamamos de lar estava fraca, na verdade, parecia vir de cada uma das gotas de sangue que se espalhavam por todos os cantos.

- Mano, espera!
- O que foi?

- Você percebeu?
- O que?

- Essa parte está normal!
- Como assim? Do que você tá falando?

- Só o nosso quarto estava de ponta cabeça, todo o resto aqui parece estar normal!
- Só então percebi - Ah, merda...

- Isso é como naquele conto...
- Isso é como naquele conto...

- E isso também!
- E isso também!

- Então agora só rest-
- Ele aparecer - Interrompi a fala de Bia. Som de passos vinham lá de cima, lá de onde era nosso quarto -.

Nos viramos e olhamos juntos para cima. Os passos eram lentos, esperar pelo próximo passo depois de um já dado fazia meu estômago revirar e minha bexiga apertar cada vez mais. E então, vimos sua sombra. Bia já estava agarrada em mim novamente. Pude ouvir som de água pingando no chão, e, esse som, veio de Bia. Eu olhei para ela e desci meu olhar para baixo... Ela estava toda mijada. E então senti ela tremer forte e sua respiração dar uma travada. Voltei meu olhar para cima. Lá estava ele.

Um homem extremamente magro, com uma blusa de moletom que não possuía braço esquerdo, isso deixava a amostra seu braço, mas com uma forma totalmente diferente, até o punho notava-se que era todo mecânico, cheio de pregos e parafusos tortos, pedaços de pele rasgada enroscadas nas engrenagens e, como o conto descrevia, onde era pra ser seus dedos haviam cinco laminas, como se fossem tesouras.

Ver aquilo me aterrorizou mais do que o local em que estávamos, já que se ele era real, provavelmente morreríamos ali. Senti um liquido quente descendo entre minhas pernas enquanto aquele "cara" nos encarava. Agora, eu tinha me mijado.

Ele parou e nos observou. Meu coração pareceu parar e senti que tinha me mijado novamente. Aquele "cara" ergueu seu braço mecânico, lentamente, e apontou uma das laminas em nossa direção, antes que eu pudesse pensar em algo, senti que perderia minha vida ali, naquele mesmo momento...

Espera. Pensei enquanto "ele" erguia seu braço lentamente. E tive certeza do que fazer assim que ele apontou uma das suas laminas em nossa direção. Como no conto em que lemos, a pessoa da esquerda morreria ali, naquele exato momento, com uma lamina atravessada na cabeça. Sem pensar duas vezes empurrei minha irmã para o lado, só pude ver o ar sendo cortado por entre nós dois.

Antes que eu pudesse ter entendido o que aconteceu, meu irmão já estava eufórico em cima de mim, me levantando, segurando firme em meu pulso e me arrastando para fora do que era nossa casa.

Fui para cima de minha irmã, agarrei em seu pulso e a arrastei para junto de mim, por entre a porta do que antes era nossa sala, para fora de casa. E então, notei:

Um mundo que foge os padrões da compreensão humana.

Mas não me surpreendi tanto. Aquilo era exatamente como descrito no conto em que lemos há pouco tempo atrás, nada fazia sentido.

- Mano, vamos correr!
- Ah, sim, me desculpa!

- Se me lembro bem, o garoto do conto e os outros dois amigos deles acharam um lugar para se esconder, certo?
- Sim, eles correram por uns 300 metros por entre uma floresta, ou melhor, por entre aquela floresta - apontei mostrando para Bia a floresta que não havia ali antes de essa coisa louca acontecer - vamos para lá também!

- Luca... Calma, deva- Não consegui terminar de falar, o mano se esqueceu que logo que os garotos do conto entraram na floresta tudo inverteu e eles caíram, assim como no quarto. E foi exatamente o que aconteceu com a gente -.
- Ahhhhhhhhhhhhhhhh - Gritei de dor ao acertar meu braço esquerdo com força em uma pedra e ao bater a cabeça no chão.

Eu dei sorte. Mas sabia que meu irmão não. Como no conto, um dos meninos quebraria um braço nessa queda, enquanto os outros dois cairiam na grama macia e não sofreriam um arranhão sequer.

- Mano! Calma, respira, respira. Temos que ter mais cuidado - disse enquanto o ajudava levantar, cuidando ao máximo para não tocar em seu braço quebrado - Eu tenho uma boa memória mas preciso da sua ajuda, não podemos cometer os mesmos erros dos outros garotos se quisermos sair vivos daqui!

A dor era demais, sem falar que eu estava tonto. Não consegui responder a Bia, apenas acenei com a cabeça. Ela retirou sua camisa de manga longa, ficando apenas com sua camisa de baixo.

Olhei ao redor e achei um galho. Quebrei no comprimento correto, rasguei minha camisa e amarrei-o no braço de meu irmão.

- Senta um pouco mano, ainda temos cerca de cinco minutos, tome três para melhorar e então sairemos daqui.
- Sim, eu me lembro. Temos que ir antes que ele aparece e mate um de nós dois - ainda estava meio tonto, me cagando para aguentar a dor, mas consegui falar - assim como fez no conto.

- Exato. Saber onde cada um morreu e no tempo certo em que morreu podemos evitar nossa morte.
- Mas mana... - tremi para falar o que eu deveria dizer - Você sabe... até podemos sobreviver por onde os outros do conto morreram, mas...

- Sim, todos eles morreram. Não sabemos o que acontece depois da morte do último, não é?
- Sim, mas ainda nos res-

- Ainda nos resta checar o que os garotos não conseguiram alcançar - o interrompi - estou certa?
- Está. Temos a vantagem de já saber o que provavelmente se não soubéssemos sofreríamos para descobrir.

- Sim, as informações descobertas pelos garotos dos contos, de uma forma ou de outra, acabou lhes custando ferimentos, alguns graves outros piores.
- Sim, mas se já sabemos para onde ir, porque não vamos direto para lá?

- Lembra-se de que "ele" aparece, depois que os garotos fogem daqui, e logo depois das minas explosivas, bem na frente dos garotos?
- Verdade. Mas como isso é possível?

- Eu também não entendi quando li no conto junto contigo, mas acredito que talvez possa haver mais de um daquele "cara".
- Dois deles?

- Talvez até mais.
- Porra. Eu não consigo acreditar nisso! Só pode ser mentira, só pode ser mentira!

- Eu também não consigo acreditar, mas não podemos arriscar.
- Você está certa - cara, o que houve com ela? Até agora a pouco ela estava se mijando, tremendo, e agora parece que seu medo se foi - Beatriz... - Falei em tom suave e tremulo - você não está com medo?

- Estou me cagando! - ela disse sorrindo - Vamos, deu o tempo, não podemos arriscar mais.

Ela agarrou minha mão direita e me ajudou a levantar. Juntos, nós adentramos a floresta...

Nós dois estávamos nos cagando, mas não podíamos fingir que aquilo não era real, pois a dor em meu braço e cabeça provavam que aquilo realmente era real... e que a merda toda, só estava prestes a começar.

Continua...

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